sexta-feira, 10 de junho de 2011

Os Poderes Latentes da Consciência


Os Poderes Latentes da Consciência
 
Novas Aptidões Humanas Estão Surgindo, Mas Seu Despertar Exige Ética
de Carlos Cardoso Aveline

Ler pensamentos, perceber o futuro, caminhar sobre as águas, levitar, mover objetos com a força da mente ou desmaterializar objetos e rematerializá-los no mesmo instante a grande distância. Estas poderão ser funções normais da consciência humana em um futuro distante. Sua importância, no entanto, é secundária. E é preciso cuidado e discernimento, porque há hoje todo um folclore em torno delas, com um batalhão de espertalhões tirando proveito da credulidade alheia.

O potencial da mente parece infinito. A história humana está repleta de relatos sobre os poderes extraordinários conquistados por santos e iogues adiantados.

De onde vêm as habilidades espetaculares que tantos sábios (e mesmo pessoas comuns) têm demonstrado possuir desde a antiguidade?

Qual a real importância delas?

Segundo a teosofia, o futuro da evolução humana é tão sagrado quanto o seu passado. A humanidade tem uma longa e bela aprendizagem pela frente. Os sábios e iogues com poderes extraordinários são mestres. São precursores. Eles vão na frente. Eles abrem caminho para que o resto da população expanda mais rapidamente sua consciência. Nesta caminhada, toda habilidade de manipular sutilmente energias materiais e semi-materiais é um fato desprezível em si mesmo, e leva a verdadeiros desastres cármicos, a menos que esteja a serviço de metas rigorosamente altruístas e impessoais.

Em sua autobiografia, o iogue Paramahansa Yogananda discute a relação entre a ciência “exata” convencional e a sabedoria do Oriente. Com a conversibilidade da matéria em energia e da energia em matéria, os físicos de vanguarda apenas redescobriram, segundo Yogananda, a antiga lei de Maya, segundo a qual o universo físico é de certo modo uma ilusão sensorial que não tem existência de fato, exceto em um plano superficial da realidade.

A partir do fato de que a matéria pode ser convertida em energia pura, fica mais fácil compreender aquilo que a superstição religiosa chama de “milagres”. Segundo Yogananda, “os Mestres capazes de materializar e desmaterializar seus corpos e outros objetos, de mover-se com a velocidade da luz, e de utilizar os raios da luz criadora para produzir instantaneamente qualquer manifestação física, têm, do ponto de vista da física, uma quantidade imponderável, ou infinita, de massa.”

A “luz criadora” de que fala Yogananda é a luz astral ou o akasha da filosofia esotérica, e constitui uma contrapartida sutil e invisível do mundo físico. O akasha possui vários níveis de densidade e sutileza. Os seus níveis mais elevados são território do espírito imortal e controlam o que é externo e denso.

Yogananda escreve:

“A consciência de um iogue perfeito identifica-se, sem esforço, não com um corpo limitado, mas com a estrutura do universo. A lei da gravitação (...) é impotente para obrigar um mestre a exibir a propriedade do peso, que é condição inerente a todos os objetos materiais. Quem tem consciência de ser Espírito Onipresente não está mais sujeito à solidez do corpo no espaço e no tempo.” [1]

Neste ponto há algo que não pode ser esquecido. Um Raja Iogue não é um Iogue porque sabe manipular energias. Ele é um Raja Iogue ou Mestre de Sabedoria pelo fato de nada desejar para si, e de estar inteiramente voltado para a meta impessoal e imparcial de beneficiar a evolução da humanidade e dos outros seres de nosso planeta.

Suas outras aptidões decorrem naturalmente da sua identificação com a luz eterna e a vida infinita. Ele nada deseja para si, porque transcendeu a ilusão segundo a qual alguém pode ser feliz como um “eu” separado. O resto é secundário. Ele está em contato com o âmago do Universo; e o Universo é governado desde o seu centro.

Alguns cientistas da ciência recente concordam com este princípio da filosofia antiga. O antigo axioma afirma: “assim no céu como na terra”: ou “assim no espírito como na matéria”. Em seu livro “O Universo Inteligente”, o físico do século 20 Fred Hoyle afirma que o universo evolui e é controlado desde seu interior, e que sua evolução flui sempre desde dentro para fora. [2]

É possível observar que a mesma evolução de dentro para fora ocorre com cada um de nós. Nosso comportamento físico é guiado por nossas emoções, que são guiadas pelos nossos pensamentos, que são guiados pelas nossas intuições mais internas, algumas das quais são quase desconhecidas do nosso cérebro pensante.

O domínio da luz astral permite ao iogue ou à pessoa dotada de funções intuitivas movimentar em alguns casos objetos, fazer levitar objetos, ter pressentimentos e exercitar outras aptidões extra-sensoriais. Um grande iogue é capaz de materializar ou desmaterializar objetos atuando a partir do interior da estrutura atômica da matéria. Ele pode fazer isto porque reduziu-se à condição de um Espírito Planetário. Ele nada mais é além da Lei eterna, e nada mais deseja a não ser o Bem Absoluto.

Antes de alcançar este ponto, ele deve aprender a desidentificar-se totalmente do mundo físico tridimensional. Quando vence o desafio, ele atinge o Nirvana e transcende o estágio atual de evolução humana. Então ele alcança a libertação da roda de reencarnações obrigatórias e completa o seu aprendizado em termos de sabedoria divina. Ele seguirá aperfeiçoando-se em outros níveis, em direção a círculos cada vez mais amplos de consciência planetária e cósmica.

Boa parte de tais seres de consciência planetária superior conservam seus corpos físicos. Eles podem viver bem mais de um século. Trabalham retirados do mundo, inspirando a evolução humana de dentro para fora e estimulando os impulsos mais elevados em cada coração e mente em que há uma firme boa vontade impessoal. Chamados de iogues perfeitos por Yogananda, estes seres são conhecidos como Imortais pelo taoísmo, como Rishis pelo hinduísmo, e Buddhas ou Arhats pelo budismo.

No final do século 19, alguns destes mestres inspiraram a criação do movimento teosófico moderno. Em colaboração com eles, Helena Blavatsky fez demonstrações de psicocinese, de desmaterializações e rematerializações de objetos, e outros fenômenos. Era necessário abrir uma brecha no materialismo cego daquele momento. A revolução industrial estava no auge e se apoiava em um cristianismo dogmático e autoritário. Os fenômenos “psíquicos” eram uma demonstração prática de que a visão mecânica e materialista da vida não tinha futuro.

Na década de 1880, Alfred Sinnett, um dos principais jornalistas ingleses, manteve correspondência com dois dos Mahatmas dos Himalaias. As cartas recebidas por Sinnett estão hoje depositadas no setor de manuscritos raros da Biblioteca Britânica, em Londres. Os estudantes podem examiná-las. Além do seu conteúdo extraordinário, há aspectos fascinantes no modo como elas foram produzidas. Escritas mentalmente no Tibete, elas se materializavam na Índia, muitas vezes aparecendo do nada diante dos olhos atônitos de pessoas da elite social, reunidas especialmente para a ocasião. Sinnett descreveu grande número destes fenômenos, feitos diante de testemunhas cujos relatos foram publicados nos jornais da época e que estão reunidos hoje em livro. Em uma destas cartas, um Mahatma explica os fenômenos de materialização e desmaterialização de objetos:

O cérebro humano é um gerador inesgotável, e da melhor qualidade, que produz força cósmica a partir da energia baixa e bruta da Natureza; o adepto completo se tornou um centro do qual se irradiam potencialidades que geram correlações e mais correlações durante épocas sem fim do tempo que virá. Esta é a chave do mistério pelo qual ele é capaz de projetar no mundo e materializar nele as formas que sua imaginação construiu no mundo invisível a partir da matéria cósmica. O adepto não cria qualquer coisa nova, mas apenas utiliza materiais que a Natureza apresenta ao redor dele (...) .” [3]

A partir da segunda metade do século vinte, a levitação, a materialização e outros fenômenos que rompem os limites do mundo físico convencional vêm sendo abordados de muitas maneiras diferentes pela mente humana. A ciência avança em sua luta com os mistérios da mecânica quântica, da astrofísica e da criação do universo. Outros aspectos desta busca do despertar de novos potenciais da consciência humana ocorrem através do sonho, da arte e da imaginação. Nas histórias em quadrinhos e filmes, super-heróis como o Capitão América, o Super-homem, e até o desajeitado Super-Pateta lutaram durante décadas pelo bem e pela justiça, sendo capazes de levitar e usar grande intuição, entre outros poderes ióguicos. No século 21, novos heróis invadiram os cinemas e as revistas. Eles tomaram conta dos filmes em DVD e ocuparam a imaginação humana voando em altas velocidades em nosso planeta, ou indo até galáxias distantes, mas sem sair da tela da televisão na cômoda sala em que o espectador come pipoca. Sentado na poltrona, Sancho Pança assiste às aventuras de Dom Quixote. O herói gaulês Asterix ainda resiste, em quadrinhos e desenhos animados, preservando elementos deste arquétipo de herói humano com aptidões especiais.

Os poderes latentes do ser humano ocupam de muitas maneiras a imaginação coletiva. Subconscientemente, nossa cultura materialista percebe a presença sutil junto à humanidade de grandes mestres dotados de tais poderes - tal como narrado nas lendas de Buddha, Jesus e outros instrutores da sabedoria imortal.

Esta fonte de inspiração comum vai desde os espetáculos populares até o lugar mais elevado das almas humanas. Os diferentes campos de conhecimento humano buscam - através de caminhos diversos - por novos níveis de compreensão da mesma e única verdade essencial.

A arte, a literatura e a ciência se inspiram mutuamente há séculos. Desde sempre, uma parcela dos sábios e cientistas estudou alquimia e filosofia esotérica, ou trabalhou com base na combinação da intuição com o trabalho experimental. Este é o caso de Isaac Newton, Thomas Edison e Albert Einstein. Há outros exemplos bem conhecidos.

Francis Bacon (1561-1626), o criador do método científico experimental, foi um sábio estudante da filosofia oculta. Ele previu o uso de submarinos e aviões, e descreveu uma civilização governada com sabedoria, em seu texto “Nova Atlântida”.

O poeta inglês Alfred Tennyson, que morreu em 1892, previu as guerras do século 20 no seu famoso poema “Loksley Hall”. Descreveu as batalhas aéreas espantosas, envolvendo inúmeros “navios voadores” que lançavam bombas. E antecipou que, depois da guerra, surgiria a ONU, a “federação das nações”, e ocorreria o desarmamento mundial (do qual já nos aproximamos lentamente desde o final da guerra fria, no século 20).

No mesmo século 19, o escritor Júlio Verne previu o submarino, o avião, a viagem à lua, a televisão e o videofone. Só no século 21 o telefone com vídeo tornou-se parte da realidade. A internet já permite ver a imagem do interlocutor, e o vídeofone está disponível a todos.

A vida imita a arte, e a arte imita a vida. A arte pode falar de coisas que o coração entende e a mente ainda não sabe explicar.

Inspirado nos fenômenos extraordinários dos primeiros tempos do movimento teosófico, o escritor inglês Conan Doyle escreveu um conto intitulado “A Máquina Desintegradora”. Nele, certo professor inventa um mecanismo capaz de “desintegrar qualquer objeto colocado ao alcance da sua esfera de influência”.

Um personagem do conto explica: “A matéria dissolve-se, voltando à sua condição molecular ou atômica. Revertendo o processo, a máquina pode reconstituir a mesma matéria.” [4]

Conan Doyle era espírita e leu sobre teosofia. Seu detetive Sherlock Holmes, dono de uma intuição extraordinária, mostra mais de um traço super-humano em sua luta pela justiça e pelo bem.

Nas obras recentes de ficção científica, o fenômeno da desmaterialização e rematerialização são chamados de teletransporte. Em filmes do gênero, é rotina ver um grupo de viajantes espaciais entrar em uma câmara especial e, depois de alguns segundos, desaparecer dali para surgir em uma galáxia distante.

No mundo real, cientistas buscam compreender e realizar os rudimentos do teletransporte. Eles partem do fato fundamental de que o comportamento das partículas subatômicas é ambíguo. Ora elas se comportam como partículas, ora se comportam como onda. As partículas subatômicas não têm localização ou materialidade definidas em um instante determinado em que se pretenda medi-las. Estão, pois, além da rede previsível do espaço-tempo. A partir daí, abre-se um horizonte novo. Seria possível transformar um objeto em ondas e depois reconstituir o mesmo objeto como “partícula” ou matéria densa em outro lugar do espaço? Em 2010, já estavam acontecendo pesquisas intensas nesta direção. Alguma coisa já se conseguia com fótons - a partícula unitária da luz - e com os estados quânticos de um átomo individual.

Para uma parcela da população, a ciência e a tecnologia parecem haver ocupado o lugar de antigas práticas religiosas. O avanço da ciência tem aspectos extremamente positivos. Por outro lado, quando a ciência obedece a mecanismos comerciais, ela passa a promover um materialismo cego, sem destruir, necessariamente, o dogmatismo religioso de conteúdo medieval. Às vezes a superstição consumista e a superstição religiosa se associam no terreno comum da ignorância submissa.

A tecnologia faz inúmeros milagres que assombrariam um cidadão de cem anos atrás. Eles também parecem ter efeitos mágicos e hipnóticos sobre a população. Os satélites geoestacionários, as viagens espaciais, a clonagem de animais e mesmo alguns objetos de uso diário, como o telefone celular, o fax e o controle remoto de televisão, para não falar da própria imagem de televisão ou do correio eletrônico, implicam processos que, na prática, são incompreensíveis para o cidadão médio e, portanto, mais ou menos milagrosos. A própria luz elétrica é um pequeno milagre. Na biologia, na informática, na física, na medicina e na astronomia, estamos indo além do plano físico. Aprendemos a dominar parcelas cada vez maiores da luz astral e do akasha. A população passa a ter fé na infalibilidade papal das corporações multinacionais, que vendem a ela os milagres e as indulgências celestiais da tecnologia colocada a serviço do dólar, e do euro.

Os grandes bancos internacionais providenciam o milagre extraordinário da multiplicação das dívidas. Os crentes pagam o dízimo com seus cartões de crédito.

O que antes apenas os místicos e iogues treinados realizavam por meios extra-sensoriais e em níveis superiores de consciência, hoje é feito por meios instrumentais, nos planos físico e intelectual, por técnicos e pesquisadores treinados.

A consciência científica e tecnocrática se expande e toca a dimensão sagrada da vida. Salvo exceções, faz isso de modo inconsciente, sem a necessária consciência ética, e usando os seus poderes para fins estritamente comerciais, a partir de uma visão estreita da vida e do universo.

No outro extremo, temos o pseudo-esoterismo usando o mesmo potencial de expansão da mente humana como pretexto para explorar a credulidade da população bem-intencionada. São os iniciados de final-de-semana, os avatares improvisados, os auto-proclamados donos de poderes psíquicos. São os canalizadores de Mestres de Sabedoria, cujos Mestres, por terem sido inventados por eles próprios, só dizem banalidades. São os clarividentes da estirpe de Annie Besant e Charles Leadbeater, que deliram sobre grandes iniciações e conversam com algum Cristo imaginário. Mas a falsidade tem pernas curtas, e sua durabilidade é escassa.

Num futuro relativamente próximo, espera-se, será descoberta e reconhecida amplamente uma verdade que possui quatro aspectos, e constitui o segredo essencial para o caminho da paz individual e coletiva. Esta verdade diz:

1) Todo saber que não é legítimo degenera rapidamente.

2) A legitimidade de um saber depende do seu uso.

3) Um conhecimento só é legítimo quando é usado para o bem.

4) O conhecimento ilegítimo, quando se refere a forças sutis, não passa de um tipo de bruxaria feita por aprendizes de feiticeiros que tentam roubar o conhecimento divino para propósitos egoístas.

O único verdadeiro milagre, o fato mais extraordinário - mais importante do que multiplicar pães, clonar ovelhas, viajar a Marte ou caminhar sem tocar o solo - é a decisão independente de purificar pacientemente as suas próprias emoções e os seus pensamentos. Esta é uma mudança quântica. Esta é a suprema atividade científica. Outras aptidões “extraordinárias” da consciência humana, enquanto forem destituídas da ética altruísta, permanecerão sempre no plano das atividades circenses de má qualidade.

O despertar do autoconhecimento e o surgimento da auto-responsabilidade ética transmutam pouco a pouco cada átomo do corpo humano e o conectam mais diretamente à mesma luz eterna que movimenta galáxias, estimula o crescimento de uma planta, explode uma estrela longínqua e desperta amor incondicional em nosso coração. Esta é também a luz interior que brilha no olhar de um animal, dá alegria de viver a uma criança e mantém nossa galáxia girando em torno do seu sol central.

Quando o ser humano compreender melhor as implicações revolucionárias do fato de que tudo o que existe está imerso na luz astral - o akasha -, então as ciências do mundo externo e físico obedecerão à ciência sagrada da alma imortal, segundo a qual o universo físico ocupa um espaço ilimitado, insondável, eternamente infinito, feito de consciência absoluta, que os sábios orientais chamam de Parabrahm. Dele surge a paz coletiva e individual, porque ele também existe, de certo modo, em cada coração humano. É a partir deste nível de despertar que estão dadas, finalmente, as condições para o desenvolvimento adequado de uma potencialidade ilimitada.


NOTAS:
[1] “Autobiografia de um Iogue”, de Paramahansa Yogananda, Summus Editorial, 455 pp., ver pp. 259-260.
[2] “O Universo Inteligente”, Fred Hoyle, Editorial Presença, Lisboa, 1993, ver pp. 235-237.
[3] “O Mundo Oculto, A Verdade Sobre as Cartas dos Mahatmas”, de Alfred P. Sinnett, Editora Teosófica, ver pp. 128-129. Leia também, da mesma editora, as “Cartas dos Mahatmas” (dois volumes).
[4] “A Máquina Desintegradora”, conto que é parte do livro “O Veneno Cósmico”, de Arthur Conan Doyle, Ed. Melhoramentos (edição sem data, da década de 1960), SP, ver pp. 148 e 151.

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